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domingo, 26 de maio de 2013

Eu Apenas Queria Que Você Soubesse

Gonzaguinha 

Eu apenas queria que você soubesse
Que aquela alegria ainda está comigo
E que a minha ternura não ficou na estrada
Não ficou no tempo presa na poeira

Eu apenas queria que você soubesse
Que esta menina hoje é uma mulher
E que esta mulher é uma menina
Que colheu seu fruto flor do seu carinho

Eu apenas queria dizer a todo mundo que me gosta
Que hoje eu me gosto muito mais
Porque me entendo muito mais também
E que a atitude de recomeçar é todo dia toda hora
É se respeitar na sua força e fé
E se olhar bem fundo até o dedão do pé

Eu apenas queira que você soubesse
Que essa criança brinca nesta roda
E não teme o corte de novas feridas
Pois tem a saúde que aprendeu com a vida

Eu apenas queria que você soubesse
Que aquela alegria ainda está comigo
E que a minha ternura não ficou na estrada
Não ficou no tempo presa na poeira

 Eu apenas queria que você soubesse
Que esta menina hoje é uma mulher
E que esta mulher é uma menina
Que colheu seu fruto flor do seu carinho

 Eu apenas queria dizer a todo mundo que me gosta
Que hoje eu me gosto muito mais
Porque me entendo muito mais também

terça-feira, 14 de maio de 2013

Aritmética da Solidão

Quando fiquei novamente solteiro, estava decepcionado com o mundo.

Entendia a solidão como sarcasmo. Minhas roupas não enchiam mais uma máquina de lavar, a comida estragava na geladeira, toda noite era fim melancólico de domingo.

Não fazia sentido estar sozinho. Logo eu, que sempre defendi a vida a dois, logo eu, que sempre valorizei o casamento, logo eu, que dizia que liberdade na vida é ter um amor para se prender – me enxergava amaldiçoado, raivoso com a falta de sorte, ofendido com as separações.

Reclamava da sina aos amigos da injustiça, já profetizava que ficaria encalhado o resto dos dias, já me preparava para ser um canalha incorrigível, já prometia encerrar o destino romântico e rasgar as crônicas enternecidas.

Minha filha Mariana buscou me acalmar. Saiu comigo para esfriar o drama. Afinal, até ópera tem intervalo.

– Pai, dá um tempo na choradeira...

– É fácil dizer porque não é contigo.

– Está se sentindo o único separado da terra, que coisa, relaxa, olha para os lados.

– É que parece que jamais vou encontrar a mulher de minha vida. Adoro a convivência a dois.

– Você já é dois, pai.

Aquela frase me confortou: eu era dois. Era inteiro. Não dependia de ninguém para me completar. Não precisava levantar os braços para o ônibus de recolhe. Não morreria de sede como uma samambaia. Poderia me cuidar, me dar ao luxo de ser egoísta e não mendigar alianças.

No momento em que aceitei a solteirice, e sorria dentro dela, conheci Juliana. E tudo que abandonei floresceu furiosamente em meus olhos. O cara que não queria mais um envolvimento sério voltou a oferecer declarações eternas.

O cara que não queria mais casamento passou a se imaginar no altar. O cara que não queria mais ter filhos descartou de vez a vasectomia. O cara que não mais confiava nas mulheres começou a desconfiar dos homens.

O namoro venceu o apocalipse, mas não eliminou a dúvida. Havia o receio de reprisar histórias anteriores. 

Fui conversar com Juliana:

– Eu sou dois sozinho.

– Pode ser três comigo – ela corrigiu. 

Eu ri. E completei:

– Então, posso ser quatro contigo. Eu e minha solidão, tu e tua solidão.

Nunca mais seria metade de ninguém. Nem de mim mesmo.

Fabrício Carpinejar 
Publicado no jornal Zero Hora 
Coluna semanal, p. 2, 14/05/2013
Porto Alegre (RS), Edição N° 17432