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terça-feira, 10 de junho de 2014

A PERFEIÇÃO DO AMOR IMPERFEITO


“Os vencedores no amor são os fortes. Os que sabem o que querem e querem o que têm! Sonhar um sonho a dois, e nunca desistir da busca de ser feliz, é para poucos!”

(Cecília Meireles)


Há uma propaganda da Natura para o Dia dos Namorados que diz: “O amor de verdade não é perfeito. E é perfeito que seja assim”. Concordo! Percorri um longo e árido caminho para chegar a esta conclusão. Passei boa parte da vida em busca do amor perfeito. Vivi a primeira grande paixão aos 12 anos, quando cursava a segunda série do ginásio no Colégio Marista de Londrina. Naquela época as classes não eram mistas e os horários de intervalo não coincidiam. Só conseguia ver o meu amor antes ou depois das aulas. De vez em quando, pedia aos professores para ir à ‘casinha’ (para os mais novos, banheiro) só para observá-la na aula de educação física. Escrevia seu nome nos cadernos, na prancheta e até em minhas mãos. Quando o pai dela não vinha buscá-la, ia com ela de ônibus ao centro da cidade. Descia e a acompanhava até bem próximo de sua casa. Pegava o ônibus novamente para ir para minha casa, que ficava do lado oposto da cidade. Passava o restante do dia ansioso para encontrá-la na próxima manhã. Foi o único amor perfeito da minha vida. Sabem por quê? Ela nunca soube da minha existência. Era um amor platônico. Eu a seguia como a sombra de seu corpo e sem deixá-la perceber a minha presença. A canção Timidez, da banda Biquíni Cavadão, retrata bem o dilema que enfrentava: “Quando eu chego perto, tudo esqueço e não tenho vez. Eu carrego comigo a grande agonia de pensar em você toda hora do dia. Na verdade nada esconde essa minha timidez”. Era um garoto tímido e sabia que “não teria vez”.

Não desisti. Aos 15 anos encontrei um novo amor. Foi em uma festa para jovens no salão social da Igreja Metodista de Londrina. Já havia sido convidado por alguns amigos para participar de atividades nessa Igreja. Como meu pai não via os “crentes” com bons olhos, sempre inventava uma desculpa. Mas, naquele dia, meus amigos foram mais convincentes. Disseram que seria uma festa ‘parecida’ com as ‘brincadeiras dançantes’ que costumávamos frequentar: “Vai ter música, bebida, salgadinhos e, o mais importante, meninas bonitas”. Acabei aceitando. Quando cheguei à festa, percebi que o ambiente era bem diferente daquele que haviam descrito. As músicas eram canções evangélicas. Bebida, só tubaína. Dançar, nem pensar. Apenas duas verdades: os salgadinhos e as meninas bonitas. Uma delas despertou a minha atenção desde o início. Meus olhos passaram a acompanhá-la em cada um de seus passos. Tentava disfarçar. Era impossível. Uma menina de rara beleza, sorridente, com olhar desarmado. Fazia parte de um dos conjuntos musicais da igreja. Quando subiu ao palco para cantar, tive a sensação de estar novamente enamorado. Menos tímido e inseguro, comecei a pensar em um plano para abordá-la. Não queria repetir as dores do amor vivido aos 12 anos. É sofrido amar na invisibilidade. Meus amigos já tinham percebido o meu interesse. Um deles chamou o irmão caçula dela, com 8 anos, e disse: “Ele quer namorar a sua irmã”. Perguntei o nome dele e disse: “João Batista, é mentira deles. Não quero namorar a sua irmã. Vá ao palco e diga que quero me casar com ela”. Ele saiu correndo e foi dar o recado. Ela me olhou e abriu um sorriso acolhedor. Aceitei como um sim. Conversei um pouco com ela e fui para casa com uma certeza. Estava apaixonado. Acreditava que tinha encontrado o amor perfeito.

Namoramos, noivamos, casamos, tivemos filhas. Aos poucos, ainda na época do namoro, percebi que o nosso amor não era tão perfeito. Tomei consciência que há rupturas e distanciamentos entre o amor idealizado e o amor vivido. Isso exige atenção redobrada. Fiquei desatento e permiti que pequenos atos do cotidiano fossem minando a relação. Atitudes insignificantes se tornaram gigantes e ocuparam o espaço reservado ao cuidado, ao respeito, ao acolhimento, à paixão e ao amor. O ímpeto da paixão adolescente foi dominado pela tirania da rotina. Aquilo que deveria ser a expressão da liberdade se transformou em prisão. Fracassei na exigente tarefa de dar conta da vida a dois. Nessas circunstâncias, é comum atribuirmos ao outro a culpa pela mesmice de nossas vidas. A separação foi inevitável. Tivemos que lidar com as perdas, entender a decepção das filhas e administrar os conflitos próprios de um rompimento. Seguimos nossos caminhos. Vivenciamos outras experiências. Amadurecemos. Em um determinado momento, após idas e vindas, separação e divórcio, o destino nos colocou novamente diante um do outro. Começamos um novo namoro. A vida nos tinha ensinado que a perfeição do amor está justamente na sua imperfeição. Casamos mais uma vez e concordamos em viver, conforme diz Adélia Prado, ‘um amor feinho’. Segundo ela, “Amor feinho é bom porque não fica velho. Cuida do essencial. Amor feinho não tem ilusão, o que ele tem é esperança: eu quero amor feinho”. Como disse uma amiga: “É o amor do tempo da delicadeza”. Nas palavras de Mário Quintana é amar “bem devagarinho”. Sem pressa. É saborear o amor aos pedaços.

Clovis Pinto de Castro
(contato@addupconsultoria.com.br)

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